domingo, 23 de fevereiro de 2014

O julgamento dos filhos a nosso respeito



Em Gn 31, vemos Jacó saindo apressadamente da casa de seu sogro, fugindo de Labão e tendo Raquel e Lia, apoiando sua decisão. O julgamento que elas fazem de seu pai é severo: “Não nos considera ele como estrangeiras? Pois nos vendeu e consumiu tudo o que nos era devido?” (Gn 31.15).
Quais percepções Lia e Raquel tinham de seu pai?

  1. Somos estrangeiras” – Na cultura nômade, estrangeiros não tinham acesso à tenda, à intimidade e à privacidade de uma casa, e eram vistos sempre como potencial ameaça.
Isto nos leva a pensar que, assim como Lia e Raquel, filhos podem se sentir alienados da vida doméstica e nunca parceiros da caminhada. A indiferença, o descaso, a alienação parental, a ausência física ou emocional podem gerar tais sentimentos de orfandade. Será que nossos filhos se sentem “estrangeiros” dentro de casa?

  1. Somos objetos” – Ele nos vendeu, nos mercantilizou. Elas entendiam que para seu pai, foram consideradas apenas como objetos de barganha e troca.
Muitos filhos se sentem assim, instrumentalizados pelos pais, por objetivos financeiros ou para alcançar status social ou reputação em um determinado segmento social. Pais podem pressionar filhos a um casamento, porque o outro é de “boa família” (leia-se, tem boas condições financeiras, status e reconhecimento social). Nossos filhos percebem este tipo de manipulação e rejeitam isto.

  1. “fomos lesadas” – Eles afirmam que Labão havia consumido tudo o que lhes era devido. Em outras palavras, sentia que ele lhes dera prejuízos financeiros. Muitos pais estão tão preocupados em ganhos, que se esquecem de abençoar os filhos, e até mesmo deixam de compreender que no final, tudo será deles mesmos.
Por esta razão, as filhas de Labão estão saindo de casa, mudando-se para uma região distante, sem qualquer consideração pelo seu pai, sem nenhum link afetivo. Elas fogem de casa, não querem abraçá-lo e não querem sequer despedir-se dele. Que triste realidade!

Nossos filhos vão julgar nossos atos. O que fazemos hoje ecoa pela etenidade. Legados são percebidos de forma positiva ou negativa pelas próximas gerações. Nossos atos não são neutros ou inconseqüentes.

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Teologia do Sofrimento



Muitas vezes afirmei que prefiro uma dor aguda a uma dor crônica. A dor aguda é forte, mas não é contínua; vem rapidamente e passa, ainda que quase nos leve ao desespero. A dor crônica é aquela que se desenvolve lentamente, chega devagar, e vai se alojamento de uma forma quase indefinida em nós, ainda que não seja muito forte e que tem um longo processo de restauração e cura. De um tempo para cá, cheguei à conclusão de que minha afirmação inicial é de uma tolice sem fim. Não prefiro uma dor ou outra. Não gosto de sofrer.
O sofrimento é um atestado de impotência, e isto mexe com minhas emoções. Já se percebeu brigando com seu corpo quando está doente, como se não admitisse que pudesse precisar de tratamento e de medicação? Brigamos também com Deus: “Como assim, sofrer? Se trago no meu coração as convicções claras de que Deus está do meu lado, pronto a me servir (servir? É isto mesmo que erroneamente acho!) então, eu não posso sofrer”. Aliás, subliminarmente estamos dizendo: “Com quem Deus pensa que está tratando?”
Haroldo Kushner relata que uma distinta mulher estava à beira da praia, assentada debaixo de uma proteção confortável, desfrutando de uma manhã linda, lendo sua revista preferida e apreciando o lindo netinho brincando na areia com seus apetrechos. Tudo estava perfeito. De repente, uma onda surpreendentemente grande veio, molhando todas as suas coisas, estragando aquele momento de relax, e pior ainda, arrastando seu adorável netinho. Aos berros ela gritou: “Deus, eu não admito que você faça isto comigo! Traga o meu netinho de volta, agora!” E outra onda imediatamente devolveu o garoto em segurança, de tal forma que o netinho nem parecia ter entendido o que havia acontecido. Ela olhou satisfeita para o lado e disse: “Muito bem, mas o Senhor ainda não devolveu o seu bonezinho!”.
Precisamos desenvolver uma teologia da dor. Billy Graham afirmou que a igreja ensina sobre a vida após morte, mas não fala sobre o processo da morte em si. Para ele, o mais difícil não é a morte, mas o morrer. O corpo vai envelhecendo e definhando, mas não sabemos lidar com este rito de passagem. Ele afirma que, ao invés de correr da dor, negá-la, blasfemarmos, ou nos irritarmos. Precisamos aprender o sentido da dor. Sem conflito não há crescimento e amadurecimento.

O sofrimento é injusto? Pelo contrário! Ele faz parte da nossa natureza caída. Embora não concorde 100% com a afirmação de Buda que “viver é sofrer”, precisamos aprender que a vida implica sim, em alguma forma de dor. Jesus não era romântico em relação à experiência humana, sua frase é muito realista: “No mundo passais por aflição, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo! Isto me parece um bom princípio para se construir uma “teologia do sofrimento!”.