quinta-feira, 7 de abril de 2011

Comer, Rezar, Amar

Na medida do possível tento ler os Best-sellers, porque compreendo que livros com grandes tiragens e cópias, assim como músicas e filmes, fazem sucesso porque de alguma forma são capazes de traduzir o sentimento coletivo de uma comunidade. O livro, a carta escarlate, de Nathaniel Hawthorne, jamais faria sucesso em nossos dias. O Best-seller acima, escrito pela jornalista Elizabeth Gilbert, já vendeu mais de quatro milhões de cópias e foi traduzido em 36 línguas. A autora relata suas experiências na Itália, Índia e Indonésia, em busca de auto conhecimento, após uma crise existencial e um divórcio doloroso.
Por esta razão me aproximei de “Comer, rezar, amar”. Seu estilo é charmoso e atraente e flui com naturalidade. Na primeira parte, fala de seu reencontro com o prazer de comer nos meses que passa na Itália, sem se condenar e sem analisar quantas calorias estava devorando diariamente.
Na segunda parte, Rezar, fala de suas experiências com o sobrenatural. Seu primeiro encontro se dá dentro do banheiro de sua casa, depois de uma crise com o marido e nas vésperas de iniciar seu processo de divórcio. Na terceira parte, Amar, relata suas aventuras ao encontrar um brasileiro na Indonésia e na descoberta do seu sentido de se relacionar novamente com alguém.
Minhas impressões?
Antes de mais nada, a vaga concepção de Deus. Em alguns momentos ela O define como um Ser sobrenatural, noutras com a natureza e ainda com o seu Eu interior, que na tradição budista é a essência da divindade. O Budista não crê em um Deus pessoal, mas a divindade é encontrada dentro de si mesmo e nas dimensões de sua ancestralidade. Curiosamente, é uma religião sem Deus. Portanto, a busca da autora por Deus é algo “Nowhere, Nobody e Non-sense” (Em lugar algum, a nenhuma pessoa e sem sentido algum). Algo bem distinto da religiosidade Judaico-cristã, que fala em um Deus que tem identidade e personalidade, que se apresenta como “O Deus de Abraão, Isaque e Jacó”, como o “Deus Pai-Filho-Espírito Santo”, que são três pessoas subsistindo em forma de uma só.
Por ter um deus vago, possui também uma ética vaga. Como as pessoas se parecem com seus deuses, um deus amorfo e impessoal não traz em si características estéticas ou morais. Por isto, sexualidade é uma “aposta interessante”, num “momento interessante”, para resolver uma carência existencial do momento. Depois de uma semana de disciplina ascética e espiritual, a autora não tem dificuldade para um encontro amoroso casual.
Já que Best-sellers traduzem o sentimento de uma época, e se esta é a espiritualidade e ética da pós-modernidade, e eu creio que sim, fiquei com um sentimento de que teremos grandes desafios no desenvolvimento de nossa fé pessoal e na educação moral desta geração.

Radiação

Logo após o terremoto e do conseqüente tsunami com suas cenas apocalípticas que atingiu de forma devastadora o Japão, além da contabilidade das perdas de bens materiais e preciosas vidas, surgiu um novo medo resultante da explosão das usinas nucleares da região atingida, cujos reatores produzem ¼ de toda energia daquela nação.
A situação realmente assusta. Em primeiro lugar, porque além das conseqüências imediatas, este efeito radiativo pode durar anos na região; em segundo porque levanta novamente toda discussão sobre a segurança dos reatores nucleares. A humanidade pode confiar nestes sistemas? Como controlar energia tão poderosa? E quando surgem tragédias e terrorismos? As informações que recebemos de tecnocratas, políticos e burocratas são confiáveis?
Uma radiação, porém me inquietou de forma particular. Com medo dos efeitos radiativos, parte da mídia e de pessoas histéricas, surgiu nos Estados Unidos, que fica do outro lado do Pacifico, uma grande ansiedade sobre os efeitos radiativos sobre aquela nação.
Tive aquela sensação típica que enfrentamos quando uma criança se machuca, e a mãe, ao invés de socorrê-lo, desmaia. Quando isto acontece temos de socorrer não apenas criança ferida, mas também a mãe desacordada. Isto é chamado em psicologia de co-dependência. Toda família se torna disfuncional porque alguém não está agindo de forma correta ou da forma que se esperava. A criança dá um espirro, e a mãe desenvolve uma pneumonia.
Tive um amigo assim. Grande artista, músico de escol, por natureza ciente de sua capacidade e com um forte senso de vaidade própria, característica de gente que lida com reconhecimento e aclamação pública. Certa vez os visitei porque sua esposa estava doente, e ela me reclamou que ele estava irreconhecível desde o início de sua enfermidade, agindo de forma reativa, porque agora as atenções das pessoas que vinham àquela casa não eram mais para suas qualidades musicais, e sim para a esposa doente.
Esta radiação da co-dependência é extremamente perigosa. Conquanto entendamos que análises mais profundas precisam ser feitas quanto ao acidente nuclear, e que todas as atenções devem estar voltadas para esta questão para que se evite outras tragédias, neste momento, nossa dor e tristeza devem estar concentradas no povo japonês e na reconstrução daquele país. Agora a nossa dor, orações e ajuda devem estar centradas na situação japonesa, que enfrenta outro grande desafio de reconstrução, depois da fatídica explosão de duas ogivas nucleares em 1945.